Obras da estrada para o Céu
do Mapiá
Já há alguns
anos, a preocupação de todos –
moradores e visitantes – com relação
à saúde do Igarapé Mapiá era
crescente. De tortuoso, semi-intransponível (pela
quantidade de troncos entrançados em seu curso),
praticamente desabitado (em toda sua extensão não
moravam mais que 10 famílias) e fechado (devido à
extensa vegetação nas margens), hoje em dia
o igarapé ia revelando extensas praias, baixo calado
para navegação, rala vegetação
e o estabelecimento de várias novas “colocações”.
Este foi o único meio de comunicação
que a comunidade dispôs desde sua fundação,
há mais de vinte anos. Veia vital para nosso abastecimento,
através dele fluiu a grande torrente energética
– maquinários, equipamentos, alimentos, visitantes
e autoridades – que fez possível a edificação
deste grande centro de assistência ao Povo da Floresta
que é a Vila Céu do Mapiá, matriz da
expansão da Doutrina do Santo Daime.
A
possibilidade de abertura de uma estrada era uma proposta
titânica e praticamente inviável. Pelo lado
do igarapé, a preocupação era crescente.
A clara modificação das estações
climáticas aqui na Amazônia tem trazido épocas
de maiores secas e maiores enchentes. A marca-recorde, na
enchente de 1998, quase foi repetida nos anos seguintes.
Igualmente aumentaram as marcas-recordes das estiagens e,
ultimamente, de julho a novembro, praticamente se tornou
proibitivo o transporte de cargas superiores a uma tonelada
através do igarapé – e, mesmo para estas,
o mínimo são dois dias de viagem, capacidade
cada vez mais restritiva para uma população
que já consome mais de 10 toneladas entre alimentos
e equipamentos, em torno de 2.000 litros entre óleo
diesel e gasolina por mês, fora o intenso movimento
de visitantes.
“....pois que os inocentes colocam os
pés onde nem os anjos ousam triscar suas asas...”
Pois que, aqui no Mapiá, como já tantas pessoas
afirmaram, costumam acontecer exatamente as coisas mais
imprevisíveis! E assim foi! Na velocidade de um raio,
chegaram os irmãos de Cascavel e Mato Grosso –
Aurélio e Argemiro –, que, após uma
breve, instrutiva e restauradora estadia na Vila Céu
do Mapiá em janeiro de 2005, já no final de
abril estavam batendo nas soleiras do Hotel Floresta, em
Boca do Acre, com um trator esteira de 22 toneladas e um
menor, para puxar uma caçamba com 5.000 litros de
combustível. As peças estavam no caminho e
o tempo urgia para que a missão fosse realizada.
O
transporte através de uma balsa até a boca
do Igarapé Mapiá foi quase que imediato, a
vazão das águas do rio Purus estabelecia e
limitava os prazos. A superação de entraves
administrativos com o IBAMA e a administração
da Floresta Nacional do Purus foi fraternalmente acertada,
principalmente com o acordo de que o trator abriria a estrada
em cima das terras altas, divisora das águas dos
Igarapés Mapiá e Quimiã. Com a proximidade
do trator, a cada dia chegavam novas notícias na
Vila dando conta de seu andamento. Mateiros iam à
frente abrindo uma pequena trilha indicativa e dando apoio
às máquinas e pessoal.
O
tempo ia passando e os entraves eram pacientemente destravados.
Para a época de São João, a trilha
estava totalmente aberta graças ao amplo apoio da
comunidade e diariamente fomos acompanhando os últimos
quilômetros. O mutirão da segunda-feira, 18
de julho, foi uma grande e festiva caminhada de mais de
30 homens já dando os arremates finais – arrancando
os tocos – na estrada que, naquele momento, estava
a pouco mais de cinco quilômetros do centro da Vila.
Os dias seguintes foram uma autêntica contagem regressiva...
No domingo, 24 de julho, já haviam passado das margens
do Quimiãzinho, construindo a única ponte
de todo o trajeto, bem no roçado do Zé Mota,
ponto de concentração de vários trabalhos
na Mata.
O
povo saiu pela trilha, agora já bem cômoda
de caminhar, e se espalhou em picnics, alegres caminhadas
e pedaladas. Na segunda, 25 de julho, finalmente o trator
encostou sua potência de 22 toneladas na cabeça
da ponte da Vila Céu do Mapiá, deixando para
trás um sulco de aproximadamente 46 quilômetros,
aproximadamente 50 hectares em área total, ligando
a Vila às margens do rio Purus – grande acontecimento
que trará, a curto, médio e longo prazo, muitas
mudanças à Vila e toda a área circunvizinha.
Já estão sendo firmados protocolos com a direção
da FLONA Purus para as normas de utilização
da nova via, que, sendo um patrimônio público,
deverá ter uma administração capacitada
para a sua automanutenção.
Com
certeza, este foi um primeiro e decisivo passo no marco
do cronograma da construção de nossa nova
sede Matriz e igualmente será via de escoamento da
riqueza oriunda do extrativismo local. Isso acontece quase
que coincidentemente à inclusão da Vila no
programa federal Luz Para Todos, que garantirá fornecimento
de energia elétrica gerada pela CEAM (Centrais Elétricas
do Amazonas), nos abrindo uma enorme gama de possibilidades
em termos de equipamentos, maquinário e assistência
técnica – afinal, com 2 horas de carro e 2
horas de “voadeira”, a pessoa (ou carga) vencerá
segura e confortavelmente a distância entre a Vila
e a cidade de Boca do Acre.
VIVA a nossos Patronos que nos ensinaram
o caminho!!!
VIVA a nossos Guias Espirituais que nos protegem!!!
VIVA a comunidade do Céu do Mapiá!!!
Vila Céu do Mapiá, 28 de Julho
de 2005