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A História da Comunicação no Céu do Mapiá

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Casa do Padrinho nos anos 80Nossa doutrina nasceu na floresta, no meio de sua gente simples. Desde aquele tempo, o Padrinho Sebastião era seu comunicador nato. Ninguém resisistia ao seu carisma e ao seu charme. Principalmente se a gente tinha disposição para acordar de madrugada e acompanhar diante do bule de café fumegante a prosa fluente e viva que combinava histórias dos tempos heróicos da seringa, pescarias e caçadas, com profundos ensinamentos espirituais.

O Padrinho nos cativava com as suas histórias. E foi graças a este impacto de amor no coração de cada um que o povo foi chegando. Alguns vieram de longe e quiseram ficar. Outros vinham , voltavam e traziam mais gente. O velho estava sempre lá na varanda, atendendo pessoalmente quem chegava e se despedindo dos que iam embora. Com a mesma atenção recebia a maior autoridade ou o ribeirinho mais doente e lascado da beira do Purus. Alojava os visitantes nas casas, cuidava do rancho e abria trabalhos de cura se este fosse o pedido.

Quando o pessoal ia embora , se ele não estivesse doente, lá estava perguntando sorridente: “E aí fulano, quando volta?”O outro respondia: “Ah Padrinho, se Deus quiser, no próximo ano no Festival de São João eu estou aí. Sebastião Mota era um homem de palavra. Fazia parte do seu modo de ser confiar também nas palavra que os outros diziam, até prova em contrário. Por isso, quando estávamos na varanda de casa grande ao entardecer, de repente ele olhava para o igarapé e para o relógio. Alguém perguntava: O que o sr tanto olha, padrinho?”Ele respondia : “Ah, o fulano disse que ia chegDespedida dos visitantesar hoje!”
Nessa época, quando ainda não existia telefone e Internet. Tudo era difícil. Nossa comunicação dependia básicamente do compromisso com a nossa própria palavra. Era isso que o velho Mota nos incutia sempre. E foi dessa forma que ele foi nos cativando e a doutrina se comunicando e expandindo.

Neste tempo o Padrinho Alfredo iniciou suas viagens ao sudeste do país e os contatos ficaram regulares. Sempre vinha gente trazendo cartas e presentes. O sistema de comunicação mais avançado nesta época era a velha fita cassete. Ela chegava por alguém que viajava mais de uma semana pelo igarapé e era ouvida na varanda da casa grande. Pela fita se mandavam as notícias das nossas igrejas, se pediam as bençãos aos padrinhos e se mandavam as lembranças para todos os membros desta grande família.

Com o tempo, as coisas foram evoluindo e a grande família foi crescendo. O Daime enfrentou muitas lutas e a gente teve que aprimorar muito a nossa comunicação. Os laços familiares se transformaram e deram lugar também aos laços institucionais. Anualmente eram realizados os encontros com todas as igrejas e os grande feitios. As máquinas de escrever que já estavam ficando obsoletas diante da nova geração dos micros, era a nossa tecnologia de ponta. Aproveitando o fluxo cada vez maior de visitantes, os malotes iam e vinham, regularizando a comunicação entre o Mapiá e as diversas igrejas que tinham se multiplicado no país e que comecavam a se desenvolver nos outros países.

Por volta de 1995 tivemos um grande upgrade quando conseguimos um velho rádio que ligava nosso escritório recém inaugurado, com um outro rádio no recém comprado Hotel Floresta, nossa base logística em Boca do Acre.

O velho rádio gemia, engasgava, distorcia mas até que comunicava. Seu grande avanço era a gente poder prever o tráfico das canoas, mandar recados para rua e ditar telegramas que eram retransmitidos por telefone da cidade. Mas ele era mais usado para fazer os pedidos de compra no armazém do Gilberto. O nosso áudio não era ainda um som digital ou de MP-3 e `as vezes havia alguns enganos. Eu. Lúcio, Enio. Lulu, Mauro, Luis Fernando, Fernando Ribeiro, se revezavam: “Alô alô Céu do Mapiá chamamdo! Atenção, a Silvia quer alho, câmbio”. Ruídos, interferência. Resposta: “Entendido, estamos mandando um baralho, câmbio”…

O velho rádio terminou entrando em pane nos meados de 1996. Foi por aí que comecamos a desenhar um novo projeto institucional para o nosso movimento. Ele previa uma separação institucional entre o trabalho social e ambiental do Cefluris e as atividades religiosas da Igreja. Fizemos um grande encontro em Mauá em 1997 para aprovar esta reforma. Pela primeira vez apareceram os primeiros laptops secretariando nossas reuniões.

Foi ainda no final deste ano que iniciamos o nosso site oficial do Santo Daime, operado pelo Jose Murilo lá em Brasília. Em 1999 refizemos o site com a roupagem que ele tem ainda hoje.
No ano de 1998, com o apoio da Fundação Friends of Forest (atual Healing Fource), obtivemos recursos para um projeto de telecomunicações e de radiotelefonia. Uma grande antena foi montada no Céu do Mapiá e uma outra em Boca do Acre e iniciamos uma nova era na nossa comunicação. Era possível agora ligar para todos os lugares do mundo. Ou quase todos, quando as condições atmosféricas permitiam. `A tarde sempre havia uma fila de moradores e visitantes para falarem com seus familiares e amigos.

Padrinho conversando com Lucio, S. João 84Foi a partir dessa época que começou também uma nova fase na história do Céu do Mapiá : o início das atividades da rádio Jagube e a do seu maior símbolo, nosso querido e saudoso Lúcio Mortimer . Pontualmente após a transmissão da Oração ao vivo, Lúcio tomava os microfones e anunciava a entrada no ar da” rádio Jagube, a voz da integração mapiense”. Em todas as casas os rádios eram ligados. O Ibope só caiu muito tempo depois, quando a televisão chegou.
Tudo tinha começado de um equipamento doado pelo irmão Félix de Barcelona. E que depois foi ampliado com o projeto do IDA de telefonia e energia. Depois que o Lúcio ficou doente e se afastou do seu Mapiá, a rádio continuou graças ao trabalho abnegado de Roberto e da Fátima Santágata. E também de outros, como a Lúcia Arruda e o Oswaldo mais recentemente.

No início de 2001, conseguimos implantar o plano de expansão telefônica rural. Inicialmente foram os orelhões comunitários e depois, as linhas residenciais.

Em fevereiro de 2002 iniciamos a conexão via Internet discada. Mas a medida que cresceram o número de linhas particulares, esta conexão foi perdendo a velocidade e se inviabilizou.

Partimos para novas iniciativas , que deram origem a implantação da nossa atual conexão satelital. Estamos com um telecentro montado dentro da rede GESAC para trabalhar com inclusão digital, com o apoio da ong Guardiões da Floresta e também prestes a instalar mais uma antena do IDA/CEFLURIS para atender a nossa demanda institucional.

Concluindo toda essa evolução e progresso, estamos no momento recebendo uma doação de recursos técnicos através do nosso irmão Jorge Perez da Espanha. Através de sua empresa, iniciamos um projeto visando formar uma grande rede mundial para abrigar nossos sites, acervos, centro de documentação, rádio, banco de dados e e-mails, sob o domínio Santo Daime.Net. Este é justamente o passo que estamos dando . E cujo primeiro resultado concreto é esta matéria, totalmente editada por nós aqui dentro da floresta.

Este é o nosso grande desafio do presente. E para que isto se realize, temos que voltar `as lembrancas do bom Padrinho Sebastião, esperando da varanda os afilhados chegarem. Pois a resposta a este desafio significa pensar melhor a integração e o equilíbrio entre essas tecnologias maravilhosas que já dispomos aqui na selva com a crença na verdade de cada um , `a exemplo do nosso bom Padrinho Sebastião.

Pois esta é a força sincrética e eclética e ética desta doutrina da floresta. Esperamos que esta união em torno deste objetivo seja o prenúncio de um novo tempo, onde poderemos cada vez mais levar nosso trabalho espiritual, social, ambiental, nossa cultura, nossas obras, para todos os rincões desta vasta aldeia global.

Céu do Mapiá, 10 de julho de 2004
Alex Polari de Alverga
secretário de comunicação do IDA/CEFLURIS
editor do site www.santodaime.org


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